terça-feira, 10 de dezembro de 2013

Pensamento brasileiro - Os brasileiros e o Estado

VLADIMIR SAFATLE
No último domingo, o Instituto Datafolha publicou uma pesquisa a respeito do posicionamento ideológico dos brasileiros. Essa não foi a primeira vez que pesquisas dessa natureza foram feitas pelo instituto, mas foi a primeira vez que questões econômicas ligadas à função do Estado, às leis trabalhistas e à importância de financiar serviços públicos apareceram. O resultado foi simplesmente surpreendente.
Se você ler os cadernos de economia dos jornais e ouvir comentaristas econômicos na televisão e no rádio, encontrará necessariamente o mesmo mantra: os impostos brasileiros são insuportavelmente altos, as leis trabalhistas apenas encarecem os custos e, quanto mais o Estado se afastar da regulação da economia, melhor. Durante décadas foi praticamente só isso o que ouvimos dos ditos "analistas" econômicos deste país. 
No entanto décadas de discurso único no campo econômico foram incapazes de fazer 47% dos brasileiros deixarem de acreditar que uma boa sociedade é aquela na qual o Estado tem condição de oferecer o máximo de serviços e benefícios públicos.
Da mesma forma, 54% associam leis trabalhistas mais à defesa dos trabalhadores do que aos empecilhos para as empresas crescerem, e 70% acham que o Estado deveria ser o principal responsável pelo crescimento do Brasil.
Agora, a pergunta que não quer calar é a seguinte: por que tais pessoas praticamente não têm voz na imprensa econômica deste país? Por que elas são tão sub-representadas na dita esfera pública?
A pesquisa ainda demonstra que, do ponto de vista dos costumes, os eleitores brasileiros não se diferenciam muito de um perfil conservador. O que deixa claro como suas escolhas eleitorais são eminentemente marcadas por posições ideológicas no campo econômico. Uma razão a mais para que tais posições possam ter maior visibilidade e estar em pé de igualdade com as posições econômicas liberais hegemônicas na imprensa brasileira.
É claro que haverá os que virão com a velha explicação ressentida: o país ama o Estado devido à "herança patrimonialista ibérica" e à falta de empreendedorismo congênita de seu povo. Essa é a velha forma de travestir egoísmo social ressentido e preconceituoso com roupas de bricolagem histórica.
Na verdade, o povo brasileiro sabe muito bem a importância da solidariedade social construída por meio da fiscalidade e da tributação dos mais ricos, assim como é cônscio da importância do fortalecimento da capacidade de intervenção do Estado e da defesa do bem comum. Só quem não sabe disso são nossos analistas econômicos, com suas consultorias milionárias pagas pelo sistema financeiro.

quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

Manufaturados - Antônio Delfim Netto


O crescimento econômico é condição necessária, mas não suficiente, para um desenvolvimento social civilizatório em que a distribuição dos seus benefícios produz uma inserção crescente da população.
Ele é condicionado por fatores internos e externos. Internamente, depende de um Estado forte, constitucionalmente controlado, com instituições capazes de assegurar a dotação adequada de bens públicos (como a segurança e o valor da moeda) e garantir as condições para o adequado e eficiente funcionamento dos mercados e sua regulação. Externamente --porque todo país é parte do mundo--, ele depende do poder de compra da exportação com a qual paga a importação. Esta última é um indispensável "fator de produção", da mesma forma que o trabalho, o capital e os recursos naturais, pela qual se apropriam, ainda, os avanços tecnológicos.
O "poder de compra" das exportações pode ser medido pela evolução da relação entre o preço médio das exportações dividido pelo preço médio das importações, à qual se dá o nome de relação de troca. A intuição física é simples: se no ano passado, uma tonelada de exportação "comprava" uma tonelada de importação e neste ano (por efeito dos preços de nossas exportações terem crescido mais do que o das importações) ela "compra" 1,1 tonelada, tudo se passa como se o país tivesse ganho de presente, 100 quilos de importação.
Visto por outro ângulo, tudo se passa como se a nossa produtividade no setor exportador tivesse crescido 10%. Os resultados dos estudos econométricos são sempre ambíguos, mas eles frequentemente confirmam que as variações nas relações de troca têm influência nas flutuações cíclicas da economia e talvez "expliquem" entre 25% e 40% das variações do PIB.
No caso do Brasil, o comportamento da relação de troca (que está relativamente estabilizada depois de ter passado por um máximo em 2010) deve ter tido alguma influência na recente queda do crescimento do PIB. Mais importante, entretanto, foi a destruição da demanda externa do setor de produtos manufaturados.
Esta foi gerada não apenas pela redução da renda dos países importadores mas, principalmente, pela dramática valorização do câmbio real produzida pelo laxismo salarial combinado com a valorização do câmbio nominal para controlar a inflação que derivava da própria política econômica.
Para se ter uma pálida ideia do que isso representou, basta dizer que o superavit exportador de 139 bilhões de dólares entre 2002/07 foi substituído pelo deficit de 136 bilhões em 2008/13. Uma fantástica redução da demanda externa dos nossos manufaturados de 275 bilhões de dólares! Por que um industrial iria investir nessas condições?
Fonte: Folha, 04.12.14

Governo no Labirinto - Índices

Queda da Petrobras é mais uma evidência de que gestão Dilma não tem estratégia adequada para a economia, que não sai da letargia
A queda de 10% no preço das ações da Petrobras na segunda-feira foi resultado direto do que já era intuído nas últimas semanas. A empresa permanece refém de uma política econômica inepta e eleitoreira, que acumula número cada vez maior de reveses.
Havia, entre investidores, a esperança de que o governo anunciasse uma nova política de preços para combustíveis capaz de dar algum respiro à Petrobras, há anos sufocada pelo populismo tarifário.
O aumento de 4% para a gasolina e de 8% para o diesel, destinado a reforçar o caixa da estatal, provocou decepção generalizada. Não só por ser uma correção insuficiente para eliminar a defasagem em relação aos preços internacionais, mas também por parecer feita na medida para a inflação neste ano ficar abaixo dos 5,84% registrados em 2012.
Foi mal recebida, ainda, a decisão do governo de manter secreta a fórmula de reajuste de preços --o que até permite especular sobre sua existência--, cuja função seria justamente dar mais previsibilidade ao fluxo de caixa da Petrobras.
São sinais eloquentes de que a estatal continuará uma marionete nas mãos do governo, queimando preciosos recursos que deveriam ser direcionados ao investimento.
Em si ruim, a novela dos combustíveis é apenas mais uma evidência de que o governo está preso em seu labirinto, acuado e incapaz de formular uma estratégia adequada para a gestão da economia.
A inflação permanece alta, os juros sobem, o dólar ameaça aumentar com mais intensidade, os resultados das contas públicas pioram e é cada vez mais claro que a economia crescerá pouco em 2014.
A retração de 0,5% no PIB do terceiro trimestre, em relação aos três meses anteriores, quase descarta uma expansão de 2,5% no ano --desempenho que já seria pífio. Para 2014, analistas começam a projetar resultado abaixo de 2%.
É particularmente preocupante que o PIB tenha encolhido sobretudo por causa dos investimentos, que caíram 2,2% no trimestre. Com isso, o acumulado do ano, positivo, apenas recuperará o tombo de 4% observado em 2012. Na prática, a taxa de investimento do Brasil permanece em parcos 18,6% do PIB, muito abaixo dos 25% da média dos emergentes e compatíveis com um crescimento de 4% ao ano.
Há, sem dúvida, um dado positivo: o desemprego de 5,2% é o menor da história. Este é o único --e fundamental-- indicador que destoa no quadro geral de dificuldades. Não se sabe até quando, pois renda, crédito e consumo crescem menos que no passado.
Talvez por aí se explique, com a ajuda das eleições, a resistência do governo a adotar grandes medidas saneadoras da economia. À luz da rapidez com que os problemas se acumulam, a teimosia pode custar muito caro ao país.
EDITORIAIS
Fonte: Folha, 04.12.13.

quinta-feira, 28 de novembro de 2013

Educação e produtividade


Será que deficiências na educação são um obstáculo tão severo aos ganhos de produtividade?
O assunto me rondou no último feriadão. No sábado, 16/11, o correspondente do "Estado de S. Paulo" Gustavo Chacra destacou no Twitter que universidades europeias estão sendo chamadas de fábricas de desempregados, o que me fez comentar que ainda há quem acredite que os problemas na educação sejam a causa definitiva do subdesenvolvimento brasileiro. Como não notar que a geração mais bem preparada da história da Espanha está desempregada?
A repercussão foi grande para o padrão de meu Twitter (@mtmiterhof). No dia seguinte, na Folha, o ex-presidente do BC Henrique Meirelles involuntariamente sumarizou os argumentos levantados contra meu comentário.
Seu objetivo era discutir como o Brasil pode elevar a produtividade para superar as restrições ao crescimento. A partir de um estudo do Banco Mundial, sua conclusão é que há uma relação direta do nível de educação com a produtividade e a renda de um país.
A correlação é inequívoca. O problema é que a simples verificação estatística de que duas ou mais variáveis aparecem simultaneamente na realidade é um campo fértil para mal-entendidos acerca da causalidade entre elas.
É difícil negar que a educação influencia a produtividade. Para Meirelles, um nível maior de aprendizado, medido em testes internacionais, é o que efetivamente eleva a produtividade. A cadeia de causalidade se completa com o entendimento de que elevar produtividade é condição para permitir acelerar o crescimento.
De fato, uma boa escola prepara trabalhadores mais capazes para tudo. Cursos técnicos formam mão de obra para setores complexos. Ter universidades de alto nível é crucial para o desenvolvimento tecnológico. Aliás, ter uma boa educação é desejável independentemente de seus efeitos econômicos.
Contudo, será que deficiências na educação são um obstáculo tão severo aos ganhos de produtividade? Afinal, um mexicano, ao cruzar a fronteira para trabalhar numa fábrica nos EUA, tem sua produtividade elevada algumas vezes.
No capitalismo, o principal mecanismo de aumento da produtividade é incorporar novas máquinas e obras civis, como em infraestrutura.
Em geral o progresso técnico ocorre de forma que os novos bens produzidos, de capital ou consumo, possam ser manejados por pessoas comuns. Alguns podem exigir treinamento, mas as empresas costumam ter sucesso nisso. No século 20, numa enorme mudança produtiva estrutural, a instalação da indústria de bens duráveis no Brasil empregou trabalhadores recém-emigrados de áreas rurais.
Hoje, a incorporação de tecnologias de informação e comunicação tem um amplo caminho para aumentar a produtividade da indústria e dos serviços. Por que jovens acostumados a usar tablets e telefones inteligentes não se adaptariam?
A falta de profissionais especializados pode em alguns casos ser restrição relevante, porém isso pode ser em parte contornado pela imigração.
Decisivo para a elevação do investimento e da produtividade é a demanda. Não à toa, apesar de sua volatilidade por natureza maior, desde 2005 o investimento cresceu acima do consumo, fazendo a taxa de investimento subir de um patamar de 16% do PIB para cerca de 19%.
A evolução da produtividade acompanha o crescimento (lei de Kaldor-Verdoorn). No Brasil, isso é ainda mais sensível porque a estrutura produtiva é grande, diversificada e heterogênea. Um crescimento baixo protege as firmas arcaicas. Mas uma demanda crescente é facilmente atendida pela atualização produtiva dessas empresas ou pelo deslocamento de trabalhadores para setores mais modernos.
A cadeia de causalidade se completa porque o crescimento também amplia a disponibilidade de recursos para melhorar os serviços públicos, como a educação.
De qualquer maneira, a relação é complexa. O aumento dos gastos para melhorar os serviços públicos é uma forma de distribuir renda e alavancar o crescimento.
Ademais, a atuação indutora do Estado na formação de empresas industriais bem-sucedidas, como discutido nas colunas anteriores, é chave para que o crescimento não seja limitado pela escassez de divisa externa, caso emblemático da Embraer, que, entre outras coisas, envolve o conhecimento produzido no ITA.
Se não é uma restrição absoluta ao crescimento, como indica a ortodoxia, a longo prazo a educação o influencia. O mais razoável parece ser que ter uma boa educação é mais resultado do que causa do desenvolvimento.

terça-feira, 26 de novembro de 2013

Terceiro Setor: Executivos estudam criar Bolsa para ONGs

Por ANDREW ROSS SORKIN
Depois de sobreviver a um câncer e fundar uma ONG, Lindsay Beck começou a pensar em como o mundo das finanças e Wall Street poderiam revolucionar o acomodado terceiro setor. Ela tentou responder a seguinte pergunta: "Poderia haver uma Nasdaq das organizações sem fins lucrativos?".
A ideia -criando o equivalente a um mercado acionário movido pelo lucro, só que para ONGs- poderia parecer contraintuitiva.
Mas, no último ano, o conceito ganhou tanta força que rendeu a Beck reuniões com executivos do Goldman Sachs, do Deutsche Bank e de membros do governo Obama. Uma equipe de advogados está trabalhando para entender quais são as implicações tributárias e como cumprir as regras da Comissão de Títulos e Câmbio (SEC, na sigla em inglês).
Se der certo, a ideia de Beck tem potencial para virar de ponta-cabeça parte da economia global. De acordo com algumas estimativas, se apenas 1% das carteiras de investimentos de indivíduos ricos nos EUA fosse direcionado para ONGs por meio de instrumentos financeiros, como títulos de impacto social ou a Bolsa de Beck, o mundo das ONGs estaria sentado em cima de US$ 1 trilhão.
Várias ideias estão vingando sobre como empregar uma abordagem com fins lucrativos no mundo das entidades sem objetivo de lucro. Neste mês, o Goldman Sachs anunciou um fundo de impacto social de US$ 250 milhões. O Morgan Stanley planeja arrecadar US$ 10 bilhões nos próximos cinco anos para o que chama de "plataforma de investimento com impacto".
Em setembro, o JPMorgan Chase se uniu à Fundação Bill e Melinda Gates para iniciar um fundo de investimentos de US$ 94 milhões destinado a financiar drogas, vacinas e ferramentas em estágio avançado para o combate a doenças como malária, tuberculose e HIV/Aids.
A ideia de Beck é fruto das suas próprias experiências. Ela foi a criadora de uma ONG, chamada Fertile Hope, que ajudava mulheres sobreviventes de câncer a engravidar.
Mais tarde, começou a examinar maneiras de tornar as ONGs mais eficazes na arrecadação de fundos. Ela diz que há muito tempo acredita que as verbas beneficentes costumam estar deslocadas -que algumas das organizações mais eficientes sofrem para arrecadar fundos, enquanto algumas das menos efetivas recebem milhões.
Isso a fez pensar: uma Bolsa, como um mercado de ações, tornaria mais transparente o sucesso -ou o fracasso- das organizações, levando mais dinheiro às melhores mãos. Além disso, se os doadores pensassem nas suas atividades beneficentes como um investimento, isso transformaria o terceiro setor. "Quando você tira o seu chapéu de benemérito e coloca o chapéu de investidor, você se comporta de uma forma muito diferente", disse ela.
Ela se inspirou parcialmente em programas que o Goldman Sachs desenvolveu para vender os chamados títulos de impacto social. A companhia criou um empréstimo de US$ 9,6 milhões para que a Prefeitura de Nova York administre um programa da MDRC, uma prestadora de serviços sociais, com o objetivo de evitar que ex-detentos da cidade voltem à prisão.
O programa tem objetivos e parâmetros claros. Se a reincidência cair 10%, a prefeitura devolverá integralmente os US$ 9,6 milhões ao Goldman. Se a reincidência cair mais do que isso, o Goldman terá lucro, limitado a US$ 2,1 milhões. No entanto, o Goldman pode perder até US$ 2,4 milhões se a reincidência não cair pelo menos 10%.
O Goldman usa seu próprio dinheiro para financiar programas desse tipo. Mas agora essa e outras empresas estão apresentando maneiras de transformar esses tipos de programas em investimentos para seus clientes. O fundo de US$ 94 milhões do JPMorgan funciona porque a Fundação Gates está se oferecendo para proteger os investidores contra possíveis prejuízos advindos do investimento em drogas e vacinas novas e arriscadas.
"No começo do investimento, você está garantindo ambos os lados do livro-caixa -o lado financeiro e o lado social", disse Alicia Glen, diretora-gerente do Goldman Sachs, sobre esses novos produtos financeiros.
Beck diz que, para ampliar significativamente esses programas, é preciso criar uma Bolsa que permita aos investidores comercializarem esses instrumentos. Dessa forma, eles poderiam manter os mais bem-sucedidos e se livrar dos fiascos.
Do ponto de vista técnico, a atual onda dos "títulos de impacto", segundo ela, consiste principalmente em "apenas contratos entre múltiplas partes com pagamentos contingentes".
Ela está desenvolvendo maneiras de criar um sistema comum para desenvolver títulos de impacto social que sejam, nas suas palavras, "títulos de verdade". A ideia de Beck para criar uma Bolsa é "muito criativa e visionária", segundo Glen, "mas pode demorar a se concretizar".
Fonte: NYT


quarta-feira, 20 de novembro de 2013

'Privatização de tudo' gerou protestos, que vão continuar - David Harvey

GEÓGRAFO DIZ QUE A CRISE MUNDIAL AMPLIOU A CONCENTRAÇÃO DA RIQUEZA E CRITICA GASTOS DO BRASIL COM COPA E OLIMPÍADA
ELEONORA DE LUCENADE SÃO PAULO
O projeto neoliberal é privatizar e "commoditizar" tudo. No seu fracasso em realizar promessas de eficiência estão as raízes dos protestos que eclodem pelo mundo e no Brasil. Partidos convencionais, reféns do capital internacional, não conseguem canalizar a raiva das ruas. Não há ideias novas, e as manifestações vão continuar.
A análise é do geógrafo marxista britânico David Harvey, 78. Professor da Universidade da Cidade de Nova York, ele ataca os "oligarcas globais" e afirma que os bilionários foram os que mais ganharam com a crise.
Crítico de megaeventos como Copa e Olimpíada, ele diz que os governos são muito influenciados pelo capital financeiro: "Esses eventos são sobre a acumulação de capital através de desenvolvimento de infraestrutura. Os pobres tendem a sofrer, e os ricos tendem a ficar mais ricos".
A partir de sexta Harvey irá a debates no Brasil sobre o lançamento de seu livro "Os Limites do Capital" e da coletânea "Cidades Rebeldes".
-
Folha - Qual sua avaliação sobre a situação mundial?

David Harvey - É muito mutante e volátil. Está tão perigosa quanto sempre foi. O que me surpreende é que não há novas ideias. As receitas propostas aprofundam o modelo neoliberal ou tentam desenvolver alguma forma de keynesianismo. Ambas opções me parecem muito frágeis.

O sr. disse à Folha em 2012 que a crise deveria aprofundar a concentração de capital e as desigualdades. Isso ocorreu?
Sim. Todos os dados mostram que o número de bilionários cresceu no mundo. Foi o grupo que melhor se saiu melhor na crise, enquanto todos os outros ou permaneceram estagnados ou perderam. O crescimento principal está sendo canalizado para o 1% mais rico da população mundial. É preciso haver uma redistribuição de renda globalmente e entre classes. O clube dos bilionários é que é o problema. Oligarcas globais controlam potencialmente ¾ da economia global. Meu ponto é: vamos para crescimento zero, sem canalizar o crescimento para eles e, ao mesmo tempo, devemos fazer uma redistribuição.

Nesse cenário haveria uma guerra, não?
Olhando para o que está acontecendo nas ruas se pode pensar que esse tipo de coisa não está tão longe assim.

Qual sua visão dos protestos pelo mundo? O sr. defendeu a criação de um "partido da indignação" para lutar contra o "partido de Wall Street". Como essa ideia evoluiu?
Os movimentos não estão indo muito bem. O poder político se moveu rapidamente para tentar reprimir os protestos. Há também muitas divisões entre os movimentos. Sobre o futuro, é muito difícil prever. A situação é muito volátil para os movimentos.

E sobre os protestos no Brasil?
Existe uma desilusão generalizada do processo político. As pessoas estão começando a discutir como modificar os piores aspectos da exploração capitalista. Há também uma alienação, que leva a alguma passividade, que é interrompida ocasionalmente por explosões de raiva. O nível de frustração por todo o mundo está muito alto agora. Não surpreende que essas manifestações ocorram. O problema é canalizar essa raiva para movimentos políticos que tenham um projeto. Prevejo mais explosões de raiva nos próximos anos --no Egito, na Suécia, no Brasil etc.

Há conexão entre esses movimentos?
Sim, cada um tem suas demandas específicas, mas há problemas de base provocados pela natureza autocrática do neoliberalismo, que virou um padrão para o comportamento político. Ele não é satisfatório para a massa da população e fracassou em entregar o que prometeu. Há uma crise na governança democrática e uma raiva contra as formas tomadas pelo capitalismo. No norte da África os protestos foram parcialmente sobre a alta nos preços da comida. Isso diz respeito ao poder do agronegócio e à especulação com as commodities, causas da alta dos preços.

No Brasil os protestos estouraram por causa da alta nas tarifas de ônibus. Como especialista em questões urbanas, como o sr. avalia o problema?
O projeto neoliberal é privatizar e "commoditizar" tudo. Tudo vira objeto das forças do mercado. Dizem que essa é a forma mais eficiente de prover bens e serviços para uma população. Mas, na verdade, é uma maneira muito eficiente de um grupo da população reunir uma grande soma de riqueza às custas de outro grupo da população --sem entregar, de fato, bens e serviços (transporte, comida, casas etc.). Essa é uma das razões do descontentamento da população. Por isso, explodem manifestações de raiva em diferentes lugares e em diferentes direções políticas. Há uma situação de fundo que dá uma visão comum às batalhas, embora cada uma delas seja específica e diferente. No Brasil foi o custo do transporte. Em outros lugares é preço da comida, da habitação etc.

Em São Paulo há também a discussão sobre o aumento do imposto sobre propriedade urbana. Isso também evidencia uma luta social?
Vamos chamar de luta de classes. Ela está mais evidente, mas muitas pessoas não gostam de falar sobre isso.

Partidos tradicionais foram pegos de surpresa no Brasil. Mas os movimentos não têm organização própria. Como isso pode se transformar em forças políticas organizadas?
Se eu tivesse essa resposta, não estaria falando com você agora. Estaria lá fora fazendo. A situação agora reflete a alienação das pessoas em relação a praticamente todos os partidos políticos e a sua desilusão com o processo político. Nos EUA, o Congresso tem uma taxa de aprovação de 10%. Nessa circunstância, as pessoas não vão canalizar o seu descontentamento para o processo político, pois não enxergam esperança nisso. Por isso, há essa raiva. E assim as coisas vão continuar.

O sr. concorda com a visão de que partidos de todos os matizes caminharam para a direita e que a esquerda se diluiu em ONGs e estruturas voláteis?
Há internacionalmente uma ortodoxia econômica, que é reforçada pelos movimentos do capital internacional. Os partidos políticos convencionais se tornaram reféns desse poder.

Isso acontece com o PT?
Isso é para o julgamento de seus leitores. Noto que há uma desilusão sobre o PT entre seus próprios integrantes.

O sr. está escrevendo um livro sobre as contradições do capitalismo. Qual é a principal?
Estão mais restritas as condições que o capital tem para crescer. É muito difícil achar novos lugares para ir e novas atividades produtivas que possam absorver a enorme quantidade de capital que está buscando atividades lucrativas. Em consequência muito capital vai para atividades especulativas, patrimônio, compra de terras, commodities. Criam-se bolhas.

O sr. escreveu que é cada vez mais difícil encontrar o inimigo. Quem é o inimigo?
O inimigo é um processo, não uma pessoa. É um processo de circulação de capital que entra e sai de países. Quando decide entrar, há um "boom"; quando decide sair, há uma depressão. Por isso é necessário controlar esse processo de circulação. O Brasil tem possibilidades limitadas, porque o capital pode simplesmente desaparecer.

No início o Brasil parecia estar indo bem na crise. Agora estamos travados. O que deu errado?
Houve mudanças modestas no Brasil no sentido de redistribuir renda, como o Bolsa Família. Mas é necessário fazer muito mais. Muito dos gastos em enormes projetos de infraestrutura ligados à Copa do Mundo e à Olimpíada são uma perda de dinheiro e de recursos. As pessoas se perguntam por que o país está fazendo todos esses investimentos para a Fifa ter um grande lucro. Para o resto do mundo é surpreendente ver brasileiros se revoltando contra novos estádios de futebol.

Copa e Olimpíada não fazem bem para o país?
A Grécia está em dificuldades em parte por causa do que foi feito em razão da Olimpíada de Atenas. Muitas cidades olímpicas nos EUA entraram em dificuldades financeiras.

Como o sr. explica o poder da Fifa e do COI?
É como qualquer poder monopolista: extrai o máximo do que se tem a oferecer. Os governos são muito influenciados pelo capital financeiro. Esses eventos são sobre a acumulação de capital através de desenvolvimento de infraestrutura, de urbanização. Envolvem também despossuir pessoas, removendo-as de suas residências para abrir espaço aos megaprojetos. Os pobres tendem a sofrer, e os ricos tendem a ficar mais ricos.

Como o sr. analisa a situação política na America Latina?
Politicamente houve, na superfície, um tipo de política antineoliberal. Mas não houve nenhum verdadeiro grande desafio para o grande capital. Há discursos anti-FMI. Mas, de outro lado, o Brasil está ofertando a exploração de seu petróleo para empresas estrangeiras, por exemplo. Não é profunda a tentativa de ir realmente contra as fundações do capitalismo neoliberal. É uma política antiliberal só na superfície, na retórica. Mas há alguns elementos, como o Bolsa Família, que não fazem parte da lógica neoliberal. Mesmo a Venezuela não vai muito longe em realmente desafiar os interesses do capital.

Os EUA não perderam posições na região?
Os EUA estão mais fracos na América Latina, em parte porque o crescimento da região foi mais orientado para a o comércio com a China, que ampliou o seu papel imensamente. De muitas formas, a economia na América Latina é muito mais sensível ao que ocorre na economia chinesa do que na norte-americana.

quarta-feira, 13 de novembro de 2013

Entrando numa bolha - MARK WEISBROT


Venezuelanos pensam que, ao comprar dólares, fazem uma aposta na qual não têm como perder. Vão se surpreender quando a bolha estourar
As bolhas de ativos são tão antigas quanto o mercado. Podem ter origens e especificidades históricas diferentes, mas a dinâmica fundamental é relativamente simples.
As pessoas compram algo porque seu preço está subindo e elas acreditam que subirá mais. Isso empurra o preço ainda mais para cima e convence mais pessoas a comprar pela mesma razão. Até a realidade se impor, e a bolha desabar.
Os Estados Unidos tiveram as duas maiores bolhas de ativos da história mundial nas duas últimas décadas: a bolha do mercado de ações, que estourou em 2000-2002, e a bolha imobiliária, que se desfez em 2006. As duas tiveram consequências graves: ambas provocaram recessões ao estourar, tendo a bolha imobiliária desencadeado a Grande Recessão, nossa pior recessão desde a Grande Depressão.
As bolhas foram especialmente dolorosas para as pessoas que compraram os ativos quando estavam no pico ou perto dele. Milhões de pessoas perderam suas casas quando a bolha imobiliária estourou.
Olhemos agora para a bolha de ativos do momento: na Venezuela, vê-se uma bolha do mercado negro de dólares. De acordo com informações disponíveis, a cotação já chega a 59 bfs (bolívares fortes) por dólar, sendo que, em janeiro, era 18 bfs. A taxa de câmbio oficial é 6,3 bfs por dólar, e há outra taxa de câmbio determinada em leilões do governo e que estaria em torno de 12 bfs.
A que se deve essa alta recente tão rápida no preço do dólar no câmbio negro? A razão principal é que as pessoas preveem que o dólar continue a subir, assim como, em 2006, os americanos previam que os preços dos imóveis residenciais nos Estados Unidos continuariam a crescer.
Mas não há razão digna de crédito para que isso aconteça. É verdade que a inflação subiu no último ano, mas a alta não está ficando acelerada, nem mesmo é consistente. A inflação chegou ao pico em maio, a 6,1% no mês, e, em agosto, já tinha caído para 3%. Desde então, voltou a subir, chegando a 4,4% em setembro e 5,1% em outubro, mas é evidente que não se trata de um cenário de hiperinflação.
O governo diz que não tem planos de desvalorizar o bolívar forte, mas, mesmo que deixasse a moeda venezuelana flutuar livremente em relação ao dólar, ela nunca se estabilizaria a um nível que nem sequer chega perto da taxa no mercado negro.
Assim, um venezuelano que adquire dólares no câmbio negro agora porque pensa que é um ativo de valor ou uma proteção contra a inflação está comprando ativos de uma bolha. Seria como comprar no Nasdaq, nos Estados Unidos, quando estava a 5.050, em março de 2000. Em outubro de 2002, o Nasdaq caiu para 1.140 e ainda hoje, mais de dez anos depois, está em 3.860.
É claro que todas as bolhas têm explicações populares que justificam que se entre na onda. Quem não se lembra da "nova economia" nos Estados Unidos, usada para justificar preços que não guardavam relação alguma com a realidade no mercado de ações? Na Venezuela, muitas pessoas pensam que, ao comprar dólares, estão fazendo uma aposta na qual não têm como sair perdendo. Elas vão se surpreender quando a bolha estourar.

quarta-feira, 23 de outubro de 2013

Tripé Econômico

1) Meta de inflação fixada pelo Congresso Nacional e perseguida pelo Banco Central;
2) Gestão orçamentária austera, a fim de manter sob o controle o tamanho da dívida pública;
3) Preço do dólar variável, com referência no mercado;

Rentistas: Caçadores de renda no meio politico (Delfim Neto)

Desde tempos imemoriais sabe-se que grupos sociais com interesses comuns tendem a associar-se para, através do governo, extrair rendas imerecidas que geram ineficiência produtiva e têm seus custos diluídos por toda a sociedade. A diferença específica que as caracteriza é que elas não são obtidas nos mercados (onde há uma contrapartida do trabalho para obtê-las), mas no universo político, em troca de votos. Desde meados dos anos 60 os economistas têm dedicado muita atenção a tal fenômeno. Em 1974 foi batizado como "caçada à renda", por Anne Krueger.
Os "caçadores de renda" vivem comodamente entre nós sem serem percebidos. São os que obtêm: 1) proteção tarifária exagerada; 2) benefícios fiscais duvidosos; 3) empréstimos a taxas de juros negativas; 4) privilégios corporativos como servidores públicos dos três Poderes e das poderosas empresas estatais; 5) regulamentação duvidosa que finge proteger o consumidor, mas protege, de fato, o prestador de serviços; 6) contratos de concessão através de corrupção; 7) estranhos benefícios como os de "organizações não governamentais" ligadas a partidos políticos e financiadas pelo governo; 8) renda protegida pela correção monetária automática etc. A lista já é longa, mas longe de ser exaustiva.
É preciso dizer que os beneficiários dos programas civilizatórios de combate à miséria e à desigualdade, que sempre podem ser aperfeiçoados, não se enquadram nessa categoria.
Pois bem, uma das hipóteses de causalidade mais fortes para explicar a queda do interesse dos governos de engajarem-se seriamente em reformas estruturais, sem as quais não há desenvolvimento econômico no longo prazo, é que elas têm um custo elevado no curto prazo para os "caçadores de renda" bem sucedidos que conseguem apropriar-se de renda indevida graças à proteção do poder incumbente.
A hipótese causal é plausível. Por um lado, os benefícios das reformas estruturais se fazem sentir ao longo de alguns anos --talvez maior do que um mandato--, são difusos e não conseguem cooptar uma massa crítica para realizá-los. Por outro, os prejuízos para os "caçadores de renda" são concentrados e eles podem facilmente mobilizar, para defendê-los, as forças políticas que elegeram. É por isso que para enfrentá-los é preciso uma liderança firme que exponha com coragem os "caçadores de renda" e acorde a sociedade para os efeitos dessa extração que de forma quase invisível consome indevidamente os recursos para o seu desenvolvimento.
Não se trata, como alguns ingênuos acreditam, de grande batalha "ideológica", mas de comezinho interesse material: apropriar-se de recursos que a sociedade desavisada lhes transferiu sem perceber!

Fonte: Folha, 23.10.2013

terça-feira, 22 de outubro de 2013

Bolhas existem o tempo todo, diz Nobel de Economia Economista dos EUA especializado em coletar e mensurar dados recomenda desconfiança do mercado financeiro

Robert Shiller, professor da Universidade Yale, foi informado na semana passada de que receberia o Prêmio Nobel de Economia, com Lars Peter Hansen e Eugene Fama, da Universidade de Chicago.
O comitê do Nobel o descreveu como fundador do campo das finanças comportamentais e inovador no uso da psicologia em economia, citando suas análises pioneiras sobre bolhas nos mercados de ações e imóveis.
Na última quarta, Shiller, parte do grupo de economistas que escrevem a coluna "Economic View" no "New York Times", me ligou do aeroporto, onde embarcava para uma palestra no banco central holandês. Eis uma versão editada da conversa.
Pergunta - Esse negócio de Nobel é muito difícil.
Robert Shiller - Verdade. Mas é maravilhoso. Agora estarei mais envolvido com o ensino. Vou preparar um curso on-line para a Coursera em janeiro, chamado "Mercados Financeiros", e fui informado de que 50 mil pessoas já se inscreveram. Também vou lecionar introdução à economia para os calouros de Yale. Falar com estudantes ajuda a nos reconduzir à realidade.
Você foi um dos criadores dos índices Case-Shiller, que medem preços de imóveis, e da "razão P/L de Shiller" --uma forma de utilizar dados sobre preços e lucros para determinar se o mercado de ações está supervalorizado. Você colabora com a Fundação Cowles de Pesquisa Econômica, que trabalha muito com a coleta de dados. Por que mensurações são importantes?
Nosso fundador, Alfred Cowles, era um gestor de investimentos que se tornou cético. A administração de fundos era uma profissão que envolvia muita falsidade --pessoas diziam ser capazes de obter retornos superiores à média sem na verdade o ser.
Ele suspeitava que seus colegas em Wall Street estivessem mentindo e não tivessem capacidade de prever o mercado. Queria dispor de pesquisas econômicas verdadeiras. E coletava dados.
Tenho essa mesma natureza desde criança.
Com Richard Thaler, da Universidade de Chicago, você foi uma das pessoas que introduziu a psicologia na teoria dos mercados. Como isso ocorreu?
Eu me casei com uma psicóloga [Virginia Shiller, instrutora clínica no Centro de Estudo da Criança em Yale], o que certamente influenciou. Também descobri que existiam certas lacunas na teoria do mercado eficiente, que era a ortodoxia no mundo das finanças, e elas não faziam nenhum sentido.
Como a "exuberância irracional", título de um de seus livros, afeta o mercado de ações e como ela se enquadra à teoria do mercado eficiente?
Essa teoria é uma meia verdade. Não é fácil ganhar muito dinheiro muito rápido, e você pode passar anos perdendo mesmo que seja muito inteligente. Onde a teoria erra é em afirmar que você deve presumir que não há interesse em tentar superar o mercado, ou que a política econômica deveria ser orientada sob a suposição de que não existem bolhas.
Portanto, bolhas existem.
Sim, o tempo todo. A maior parte das ações no mercado de capitais, em termos agregados, consiste de bolhas. Isso não se aplica a ações individuais, mas se aplica ao mercado como um todo.
Você já escreveu muito sobre bolhas no mercado imobiliário, como a que conduziu à crise financeira da qual ainda nos recuperamos. Você constatou que os preços de imóveis em geral se movem mais devagar que os das ações. Por quê?
O mercado imobiliário, em geral, é de amadores; não é fácil para as pessoas agirem rapidamente. Mas os profissionais estão chegando, e isso pode mudar.
Leia a íntegra em

segunda-feira, 7 de outubro de 2013

Problemas da economia não são difíceis de resolver

Solução passa por maior diálogo entre governo e setor privado para agilizar investimento, afirma executivo
MORRIS KACHANIDE SÃO PAULO
A capa da revista "Economist", com o título "Será que o Brasil estragou tudo?", não precisa necessariamente ser levada a ferro e fogo. As condições econômicas podem ser menos favoráveis, mas a solução passa por maior agilidade do governo para captar investimentos privados.
A afirmação é do executivo Fabio Barbosa, 59, que desde 2011 preside o Grupo Abril e também comandou Febraban (2007) e Santander (2007-10), além do ABN-Amro.
Desde 2011, preside o Grupo Abril e há três meses sucedeu FHC no comando da Fundação Osesp, organização social que mantém contrato com o governo do Estado para gestão da orquestra sinfônica e da Sala São Paulo.
O propósito da entrevista a seguir era falar sobre os desafios da Osesp. Após meia hora, a conversa enveredou pela economia brasileira, as perspectivas dos grandes grupos de mídia e o momento atual da editora Abril.
Osesp
Os horizontes se abriram, na medida em que a orquestra se tornou mais respeitada. O desafio agora é definir quais são os objetivos daqui em diante. Isso passa pela qualidade da orquestra, valorização do músico, e disseminação da cultura. A Osesp não deve ser popularizada --no sentido de abrir mão de sua excelência-- nem elitizada.
Contexto econômico
O Brasil opera em condições menos favoráveis que nos primeiros anos deste século. Os preços das commodities e as relações de troca se deterioram, refletindo na balança comercial e na própria correção cambial.
Há décadas convivemos com um problema de baixo investimento, dada a limitada capacidade de investimento do Estado. Agora o governo está se abrindo para concessões no setor privado em infraestrutura, que é justamente o maior gargalo.
Vejo com clareza uma situação de tentativa e erro, para se descobrir qual o modelo que vai funcionar. Os leilões e as concessões mais recentes mostram que o governo ainda busca equilíbrio entre a proposta de atrair capital privado sem onerar demasiadamente o usuário da infraestrutura.
Crescimento e inflação
A economia cresceu, incorporando um contingente importante de novos consumidores, o que nos leva a esse gargalo. O Brasil tem problemas, mas que não são tão difíceis de resolver. O tema central é a produtividade, pois estamos vivendo o chamado bônus demográfico --nem tantos aposentados e nem tantos jovens. Portanto seria o momento certo para o país crescer e enriquecer, antes de envelhecer. Daí o incômodo com o crescimento baixo.
Atuação do governo
O governo identificou a necessidade de trazer o setor privado para investir. Mas ainda não houve um entendimento sobre as condições aceitáveis para que saia o investimento. Essa compreensão está atrasando e é um diálogo fundamental. O governo precisa do setor privado, e o setor privado precisa de condições adequadas.
Mídia
A tecnologia mudou mas o conceito continua o mesmo. O papel da mídia enquanto instituição de informação e credibilidade continua inalterado. Agora, chegar ao leitor é algo que mudou, e temos que nos preparar para estar onde ele quiser, com a plataforma e linguagem adequada.
Fim do papel?
O problema não é de circulação ou aceitação das marcas. Acredito que o papel sempre vai existir porque tem leitores que querem. Mas este que é o ponto, recentemente ouvi de um editor que nossa responsabilidade agora é de sermos agnósticos com relação à plataforma [expressão originalmente cunhada pelo publisher do jornal "New York Times", Arthur Sulzberger Jr.]. Não importa se é papel, tablet ou móvel. O que importa é que existe gente interessada em se comunicar com a marca.
Editora Abril
Estamos exatamente neste ponto, de buscar o digital como forma de se conectar com a sociedade.
Identificamos grande aceitação de nossos produtos, mas a forma através da qual esse produto chega ao leitor ou anunciante tem que ser atualizada.
Leia íntegra da entrevista com Fabio Barbosa


Fonte: Folha, 03.10.2013

quinta-feira, 3 de outubro de 2013

The Economist - Founded in 1843


Políticas de controle ( FEC's)

1) Política Fiscal: controle dos gastos públicos. Ex. Seguridade Social
2) Política Econômica: controle da inflação. Ex. metas
3) Política Cambial: controle da balança comercial. Ex. déficits

terça-feira, 17 de setembro de 2013

Larry Randall Wray - Só crescimento liderado pelo Estado leva à recuperação

O sistema econômico global é frágil, e uma crise de grandes proporções pode voltar a ocorrer. A avaliação é de Larry Randall Wray, professor de economia da Universidade do Missouri (EUA). Para ele, "só o crescimento liderado pelo setor governamental vai permitir que os países se recuperem plenamente".
Estudioso de John Maynard Keynes (1883-1946), Wray foi aluno de Hyman Minsky (1919-1996). Na sua visão, a crise desencadeada há cinco anos com a quebra do Lehman Brothers levou ao descrédito as políticas neoliberais, que deveriam estar na lixeira das escolas de economia. "Os histéricos do deficit estão errados", afirma.
University of Missouri-Kansas City
O professor de economia da Universidade de Missouri, Larry Randall Wray
O professor de economia da Universidade de Missouri, Larry Randall Wray
Autor de "Trabalho e Moeda Hoje" (Contraponto), o economista defende um programa universal de garantia de emprego, no qual o governo fica preparado para ser um empregador de última instância. Abaixo, trechos da entrevista concedida por e-mail.
*
Folha - A crise internacional, que teve como marco o colapso do Lehman Brothers, completa cinco anos. O que mudou na economia mundial nesse período?
Larry Randall Wray - Infelizmente, o sistema financeiro global foi restaurado ao que era em 2006 graças a gigantescas operações de resgate feitas pelo setor público. O sistema não foi reformado nem investigado ou processado por fraude. Basicamente, ele foi autorizado a voltar a fazer o que estava fazendo nos anos anteriores à crise.
As economias reais ainda estão financeirizadas, com muitas dívidas e com o setor financeiro tendo uma fatia muito grande de lucros. Como resultado, na maioria dos países desenvolvidos o setor real está muito fraco. Os Brics [Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul] tiveram sucesso em evitar o pior da crise e até tiveram ganhos com seus setores reais. O desenvolvimento da economia chinesa é sem precedentes.
A crise acabou? Está perto do fim? Vai ficar pior?
Não acabou. Sobretudo na zona do euro. Embora possa parecer que os EUA, o Reino Unido e alguns países desenvolvidos fora da Europa se recuperaram, seus setores reais estão fracos e suas instituições financeiras retomaram práticas de risco. O sistema econômico global é frágil, e uma crise de grandes proporções pode voltar a ocorrer.
EUA, Europa e países emergentes enfrentaram a crise de diferentes formas. Quem foi mais eficaz?
EUA, Europa e Reino Unido focaram em sustentar seus sistemas financeiros, e deixaram os setores reais caírem em recessões profundas. Os estabilizadores fiscais impediram que se instalasse uma grande depressão como a de 1930. As receitas fiscais caíram e os gastos governamentais subiram, mas não o suficiente para restaurar um crescimento robusto.
Só o crescimento liderado pelo setor governamental vai permitir que os países se recuperem plenamente, reduzindo o endividamento privado. Isso não está ocorrendo. Alguns países, sobretudo a China, usaram enormes estímulos fiscais. Ao mesmo tempo, nações produtoras de commodities foram ajudadas pela retomada da bolha global desse mercado. Dessa forma, a sorte desempenhou um papel importante na ajuda a economias emergentes.
A crise foi um golpe para as ideias neoliberais?
Certamente. Nenhum dos neoliberais viu a crise chegar. De fato, todas as políticas que eles recomendavam ajudaram a trazer a crise e nem deveriam ser ensinadas nos cursos de economia. Neoclássicos, círculo de negócios real, novo consenso monetário, regras de Taylor, hipótese de mercados eficientes: tudo deveria ser relegado à lata de lixo da história dos cursos de pensamento econômico. Todas essas teorias estão completamente desacreditadas.
Como estudioso de Keynes, o sr. diria que suas ideias voltaram com a crise?
Voltou uma versão bastarda do pensamento de Keynes, a que permite um papel positivo para o governo. No entanto, os administradores públicos perderam a cabeça com o aumento dos déficits orçamentários. Optaram pela austeridade e cederam à grande finança. Assim, não temos estímulos fiscais suficientes e nenhuma regulamentação significativa.
A crise fortaleceu ou enfraqueceu o sistema financeiro global?
Enfraqueceu. Ainda temos quase toda a financeirização, mas sem o crescimento econômico. Os encargos da dívidas aumentaram.
A crise fortaleceu ou enfraqueceu o poder dos Estados?
Enfraqueceu. A histeria do deficit forçou a austeridade e há cortes governamentais por toda a parte.
Fortes investimentos estatais sempre foram vitais para recuperar economias no passado. Por que os governos hesitam em gastar?
Medo irracional de deficit orçamentários. Os falcões do deficit atacam aqueles dirigentes políticos que ousam usar o governo para promover o desenvolvimento econômico. Está claro que a austeridade não costuma realmente reduzir os deficit orçamentários, pois mata a economia e destrói receitas fiscais. Quando isso acontece, os defensores da austeridade exigem mais derramamento de sangue na forma de cortes do orçamento. Isso cria um círculo vicioso.
Na realidade, gastos governamentais são o caminho mais seguro para a recuperação, pois não dependem das dívidas do setor privado. E criam renda no setor privado, fornecem títulos públicos seguros para a riqueza do setor privado. Os histéricos do deficit estão errados.
O Brasil voltou a aumentar suas taxas de juros. Essa decisão está na direção certa?
Não posso dizer com certeza, mas prefiro muito mais taxas permanentemente baixas. Zero é provavelmente o melhor. Elevar as taxas de juros não é uma boa maneira de combater a inflação. Se o problema é excesso de empréstimos e gastos, é melhor usar controles de crédito. Se o câmbio está caindo mais que o desejado, é melhor adotar controles de capital. Sei que acordos internacionais e a política interferem nisso.
Como o sr. avalia a questão do desemprego pelo mundo?
O desemprego entre os jovens e os grupos desfavorecidos é crônico e está aumentando. É causado tanto por fatores cíclicos -a retração que ocorreu na sequência da crise financeira global- quanto por tendências de longo prazo -o descompasso estrutural crescente, com crescimento e desemprego. Precisamos de uma solução. O único plano que conheço com chance de sucesso é um programa universal de garantia de emprego, no qual o governo fica preparado para ser um empregador de última instância. Todo país precisa disso.
A crise provocou mudanças políticas em vários países. Qual é o significado disso?
Parece que algumas mudanças benéficas aconteceram na América do Sul. Estive recentemente no Equador e fiquei impressionado com a vontade dos políticos de tentar coisas novas. Eu diria mesmo da China. A maior parte do mundo demitiu e continua a tentar as políticas neoliberais que falharam.
A crise colocou em questão o sistema do euro. O que é possível prever para o seu futuro?
Era possível prever o futuro da zona do euro mesmo antes da unificação monetária. Foi um plano falho condenado ao fracasso. Não é possível separar moeda e autoridade fiscal. Era claro que na primeira grave crise econômica ou financeira haveria um desastre. Foi o que aconteceu.
Como o sr. avalia a recuperação norte-americana?
Que recuperação? Ela não começou. Estamos batendo no fundo, à espera de uma nova crise. Só Wall Street vai bem, mesmo que de forma temporária, em grande parte devido a balanços falsos.
Como o sr. analisa a situação da China?
O setor bancário informal da China explodiu, fazendo as mesmas coisas que as outras instituições financeiras paralelas ["shadow banks", que passa ao largo das regulamentações] fizeram pelo mundo todo. No entanto, tenho esperança de que a China vai encontrar uma solução melhor. Em vez de sustentar o sistema financeiro paralelo, eles deveriam restringi-los, eliminando suas práticas ruins.
Por que os países emergentes passam por uma turbulência hoje?
Há uma série de razões. A mais importante deve ser a chegada ao fim do boom especulativo de commodities. Além disso, se os EUA e a Europa continuam a crescer lentamente, há redução de mercados para as exportações globais.

Fonte: Folha de São Paulo, ELEONORA DE LUCENA . 14/09/2013;

terça-feira, 10 de setembro de 2013

Mark Blyth - Austerity, the history of a dangerous idea

"Os bancos prometeram crescimento, entregaram perdas, passaram o custo para o Estado e depois culparam o Estado pelo deficit"
"

quarta-feira, 28 de agosto de 2013

quarta-feira, 21 de agosto de 2013

Políticas intercambiantes no âmbito da Economia

1) Política Econômica: relação dívida/PIB (política fiscal - austera, neutra ou expansionista- e crescimento econômico);
2) Política Monetária: relaciona inflação e taxa de juros;
3) Política Cambial: valorização/desvalorização da moeda;

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terça-feira, 20 de agosto de 2013

Five Fragiles - Morgan Stanley (Brasil, Índia, Indonésia, Turquia África do Sul)

Problemas em Comum (Vinicius Torres Freire):
1) Deficit externo crescentemente incômodo (excesso de importações para consumo não sustentável);
2) Fim do boom das commodities devido ao rearranjo do dragão chinês (alta dependência de exportações de mercadorias com baixo valor agregado);
3) Muito tempo com a moeda valorizada que reduz as exportações e aumenta a inflação;
4) Política econômica nutrida por alta taxa de juros;
5) Baixo crescimento por longo período;

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quarta-feira, 14 de agosto de 2013

New President of Federal Reserv

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Alexandre Schwartsman


Ajuste Fiscal e sua relação de complementaridade com os investimentos em infraestrutura

- Ponto de clivagem: capacidade gerencial do poder público e a visão de mundo para um projeto de nação (ou a falta deles)
- De cada 100 reais gasto pelo poder público, apenas 27 reais é direcionado para a ampliação da capacidade produtiva do País;
- Despesas Correntes: uma vez previstas no orçamento, basta um mero ato administrativo;
- Despesas de Capital: uma vez previstas no orçamento, exige habilidades políticas e administrativas mais sofisticadas para produzir um ambiente que demonstre o cumprimento virtuoso dos até então denominados obstáculos regulatórios (ambientais, concorrenciais e licitatórios);


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