quarta-feira, 11 de fevereiro de 2015

Petrobras

ANTONIO DELFIM NETTO

Os portadores da opinião que o ente metafísico a que se dá o nome de mercado é divino, vêm a sua materialidade nas cotações das Bolsas. Trata-se de pura ideologia.


Deixem o mercado trabalhar livremente e ele, por si mesmo, encontrará "naturalmente" o equilíbrio gerador da estabilidade e da prosperidade! A Bolsa de Valores foi a fonte da expansão que criou o "capitalismo": a generalização da sociedade anônima; a acumulação do capital necessário para financiar empreendimentos arriscados com ações que repartem o risco e simultaneamente lhe dão liquidez; a criação dos bancos que transformam o curto prazo em longo etc.
Longa experiência histórica, entretanto, mostra que sem uma regulação que imponha alguma moralidade aos seus operadores, cuja imaginação parece infinita, o "mercado" tem uma enorme propensão à fraude que sempre pune apenas honestos e incautos investidores. Em pelo menos dois episódios --1929 e 2007--, produziram tragédias mundiais.
Quem se interessar pela história verá que, guardadas as proporções, aquelas duas crises (que não se confundem com as crises ínsitas ao sistema capitalista) tiveram a mesma origem e foram apoiadas na mesma ideologia.
Ela dominou o pensamento econômico que se seguiu à Primeira Guerra Mundial e foi posteriormente recuperada pela lenta destruição do controle rooseveltiano que salvou o "capitalismo" na crise de 1929. Meio século depois, o sistema financeiro logrou capturar o poder político nos EUA nas eras Reagan-Bush pai-Clinton-Bush filho-Obama 1-(1981-2012) e, com o apoio "ad hoc" de economistas do "mercado perfeito", destruiu toda regulação que o constrangia e restabeleceu a ideologia do "laissez-faire".
Deu no que deu, outra vez!
Logo, a opinião do tal "mercado" revelada no seu oráculo, a Bolsa de Valores, deve ser levada "cum grano salis".
A Petrobras continua, indisputadamente, no "estado da arte" na sua componente tecnológica e seu trágico desarranjo, que vai ser analisado e punido, se for o caso, pelo Judiciário, é basicamente organizacional e financeiro.
Por que, então, estranhar a escolha de dois excelentes administradores financeiros, os senhores Aldemir Bendini e Ivan de Souza Monteiro, testados com sucesso numa organização gigantesca, eficiente e de alta qualidade profissional, o Banco do Brasil?
Por que, afinal, eles precisam "entender" de petróleo como pediu o tal "mercado", se têm na diretoria técnicos que cresceram na Petrobras e entendem dele?
Aliás, o mercado, entende de petróleo? Então por que ainda está tonto com a queda dos seus preços?  Folha, 11.02.2015.

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2015

Como investir em títulos públicos


O Tesouro Direto é seu acesso ao mercado de títulos públicos, os papéis mais seguros do mercado
Na Semana passada, vimos como investir em depósitos bancários, que financiam grande parte das operações de crédito concedidas pelos bancos a pessoas físicas e jurídicas que precisam de dinheiro.
Hoje vamos ver como investir em títulos públicos, viabilizando o financiamento de inúmeros projetos do governo. Qualquer pessoa física pode investir via Tesouro Direto, um programa de venda de títulos públicos desenvolvido pelo Tesouro Nacional em parceria com a BM&FBovespa.
OS TÍTULOS
Títulos públicos são considerados os de menor risco da economia de um país, sendo garantidos pelo Tesouro Nacional. O investidor escolhe o prazo da operação e a rentabilidade que deseja receber. Para facilitar a compreensão dos investidores, a partir deste mês o nome dos títulos passa a identificar com clareza a rentabilidade que o título oferece.
Tesouro Selic será o novo nome da antiga LFT (Letra Financeira do Tesouro); a LTN (Letra do Tesouro Nacional) e a NTN-F (Nota do Tesouro Nacional - Série F) adotam o nome Tesouro Prefixado e Tesouro Prefixado com juros semestrais, respectivamente; Tesouro IPCA será o novo nome da NTN-B Principal (Nota do Tesouro Nacional - Série B Principal), e Tesouro IPCA com juros semestrais, a NTN-B (Nota do Tesouro Nacional - Série B). O nome trará ainda o ano de vencimento do título, exemplo, Tesouro Selic 2017.
INDICAÇÃO
Tesouro Prefixado é indicado a investidores que acreditam que a taxa negociada será maior do que a taxa de juros de mercado.
Tesouro Selic é indicado aos investidores que acreditam na alta dos juros e preferem ganhar a taxa do mercado. A indicação se fortalece em períodos de incerteza.
Tesouro IPCA é indicado para investidores que querem proteger o capital contra a inflação além de assegurar o ganho de taxa de juros real, acima da inflação, têm horizonte de longo prazo e podem esperar a data de vencimento do título para atingir esse objetivo, pois a venda antecipada expõe o investidor ao risco de mercado.
LIQUIDEZ
O investidor pode revender os títulos semanalmente, das 9h de quarta-feira até as 5h de quinta-feira. Nesse dia, o portal do Tesouro Direto vai apresentar duas colunas de taxas, uma para comprar e outra para vender títulos. O preço do título antes do vencimento é definido de acordo com a taxa de juros vigente no mercado e pode representar ganho ou perda financeira para o investidor.
COMO INVESTIR
O investidor deve abrir conta em uma das instituições habilitadas a operar nesse ambiente. Após o cadastro, uma senha será fornecida para acesso à área exclusiva do Tesouro Direto pela internet. Consulte no site o nome e as taxas cobradas pelas instituições habilitadas (chamadas agentes de custódia).
Pequenos investidores são muito bem-vindos! O limite mínimo de compra é de 10% do valor de um título (0,1 título), respeitado o valor mínimo de R$ 30,00. O limite máximo de compras mensais é de R$ 1 milhão, tanto para as compras tradicionais quanto para as programadas. Consulte o portal para mais informações.
CUSTOS
Os custos são relativamente baixos, inferiores aos praticados pela maioria dos fundos de investimento e planos de previdência privada, principalmente no caso de pequenos investidores. Para a BM&FBovespa, o investidor pagará taxa de 0,3% ao ano sobre o valor dos títulos. Aos agentes de custódia pagará taxa de serviço, livremente negociada entre as partes.
Assim, no momento da compra o investidor pagará o valor da transação (preço unitário do título vezes a quantidade adquirida) mais a taxa do agente de custódia referente ao primeiro ano de custódia, ou proporcional ao prazo do título se o vencimento for inferior a um ano.
Supondo que o investidor pague 0,3% ao ano ao agente de custódia mais 0,3% ao ano para a BM&FBovespa, seu custo total será de 0,6% ao ano. Bom e barato, vale a pena conferir! Folha, 02.02.2015.

    Brasil no buraco


    País terminou 2014 com maior deficit de que se tem registro; missão de pôr as contas públicas em ordem será ainda mais difícil


    Na semana passada o país finalmente conheceu na plenitude os resultados da irresponsabilidade que marcou a gestão das contas públicas durante boa parte do governo Dilma Rousseff (PT). O Brasil terminou 2014 com o maior deficit de que se tem registro.
    Foi um rombo de R$ 344 bilhões, o equivalente a 6,7% do PIB. Uma parcela dessa cifra (R$ 32,5 bilhões) decorre do saldo primário negativo --ou seja, o setor público gastou mais do que arrecadou, mesmo antes do pagamento de juros da dívida. A maior fatia, cerca de 6,1% do PIB, explica-se justamente pelos juros --uma enormidade.
    Não surpreende, assim, que o governo tenha feito o máximo esforço para aprovar no Congresso o abandono da meta de poupança. Sem a manobra, os gestores públicos responsáveis pelo descalabro estariam ameaçados pelas sanções administrativas e até penais estipuladas em lei.
    Disso eles escaparam, mas dificultaram a tarefa de Joaquim Levy, titular da pasta da Fazenda. O buraco aberto em 2014 mostrou-se mais fundo do que previsto por analistas e, certamente, pelo próprio ministro recém-chegado.
    Em outras palavras, o aperto necessário para atingir o superavit primário de 1,2% do PIB prometido para 2015 terá de ser maior: passou de cerca de R$ 65 bilhões para R$ 100 bilhões.
    As medidas já anunciadas por Levy (como cortes de gastos, mudanças no seguro-desemprego, abono salarial e pensão por morte, aumento de tributos) trarão cerca da metade do valor necessário.
    Torna-se quase impossível cumprir a meta sem novos cortes draconianos ou mais aumento de tributos. Quais? Da reversão de desonerações, inclusive na folha de pagamentos, ao Imposto de Renda, nada está fora de cogitação.
    Um quadro desalentador; superá-lo exigirá persistência e competência da nova equipe econômica, bem como apoio de um Legislativo que não dá sinais de querer trégua com o Executivo.
    A equação ainda se complica quando se leva em conta a paciência do contribuinte, já consumida pela recessão, pela alta na conta de luz, no preço dos transportes urbanos e no IPTU --sem mencionar o risco de faltar energia e água.
    A presidente Dilma Rousseff, de forma tardia e apenas por questão de sobrevivência política, ao menos reconheceu a necessidade de mudar os rumos na economia.
    Mas os ajustes seriam mais fáceis se Dilma se portasse como estadista, reconhecendo erros e falando com franqueza ao país sobre os desafios que estão à frente. Enquanto insistir em dourar a pílula, não contará com a boa vontade dos brasileiros. Folha, 02.02.2015.